Este estudo propõe discutir a qualificação jurídica das águas e da cobrança pelo uso dos recursos hídricos e verificar como os valores derivados dessa cobrança poderiam ser repassados às entidades delegatárias, como estas poderiam aplicá-los na execução dos planos de bacia e quais os instrumentos legais de controle aplicáveis aos investimentos dos recursos públicos por essas entidades privadas.

 

1 INTRODUÇÃO

Quando se busca estudar ou tratar do tema recursos hídricos no Brasil, há de se reconhecer que, embora a lei federal reguladora seja de 1997, ainda existem inúmeras controvérsias a respeito da cobrança pelo uso dos referidos recursos e da aplicação dos valores arrecadados, seja do ponto de vista de evolução normativa, seja do ponto de vista de gestão.

Dentro do arcabouço legal vigente, é de se destacar que o legislador optou por facultar o uso dos recursos hídricos mediante contraprestação. Ocorre que, de um lado, essa prestação ainda é pouco difundida (cobrada) e, de outro, quando cobrada, ainda não tem uma aplicação integral e poderia ser mais efetiva.

O presente estudo, nesse contexto, visa estimular a discussão sobre a cobrança pelo uso da água e sobre os aperfeiçoamentos no sistema de controle que não apenas garantam sua destinação legal, mas também contribuam para o aperfeiçoamento da sua gestão.

 

2 NATUREZA JURÍDICA DA COBRANÇA PELO USO DE RECURSOS HÍDRICOS

A Constituição Federal qualifica a água como bem público administrado pela União ou pelos Estados (arts. 20, III, 26, I). Embora o legislador constituinte tenha optado pela redação “são bens da União” e “incluem-se entre os bens do Estado”, não há dúvidas de que os termos União e Estados não são sinônimos de Poder Executivo Federal ou Poder Executivo Estadual, mas signos representativos da sociedade brasileira organizada. Aliás, esse entendimento resulta de doutrina consolidada sobre a definição de bens públicos.

 

Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2013, p.736) expõe que:

são bens de domínio público os de uso comum do povo e os de uso especial. Consideram-se bens de uso comum do povo aqueles que, por determinação legal ou por sua própria natureza, podem ser utilizados por todos em igualdade de condições, sem necessidade de consentimento individualizado por parte da Administração. Dentre eles, citem-se as ruas, praças, estradas, águas do mar, rios navegáveis e ilhas oceânicas.

 

Para complementar tal conceituação, vale a reprodução dos ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello, que esclarece:

É sabido que os bens de uso comum, como as ruas, praças, estradas, rios, mares, etc. são abertos à livre utilização de todos. Entretanto, a variedade de usos por ele comportados leva a que se indague em que condições estão abertos a esta indiscriminada utilização que lhes é característica qualificadora. Importa fixar, de logo, que os bens de uso comum, como o nome indica, fundamentalmente servem para serem utilizados indistintamente por quaisquer sujeitos, em concorrência igualitária e harmoniosa com os demais, de acordo com o destino do bem e condições que não lhe causem uma sobrecarga invulgar. Este é o uso comum.”. […] É claro que a sobredita utilização far-se-á na conformidade das normas gerais aplicáveis a todos. Assim, por exemplo, os veículos podem trafegar nas ruas, mas terão de respeitar as regras de trânsito (mãos de direção, sinais de trânsito, etc.). A navegação nos mares pode ser empreendida por qualquer pessoa, mas desde que tenha a habilitação correspondente: licença de arrais, de mestre, etc. Além disto, dependendo do que as leis estabeleçam, o uso comum pode ser gratuito ou remunerado. Assim, a circulação de veículos nas estradas é livre, mas seus condutores, para fazê-lo, terão que pagar o pedágio caso estabelecido. (…) Além do uso comum dos bens de uso comum, isto é, deste uso livre, podem ocorrer hipóteses em que alguém necessite ou pretenda deles fazer usos especiais, ou seja, que se afastem das características dantes apontadas, por implicarem sobrecarga do bem, transtorno ou impedimento para a concorrente e igualitária utilização de terceiros ou ainda por demandarem até mesmo o desfrute de uma exclusividade no uso sobre parte do bem. (MELLO, 2006, p. 878-880).

 

Este artigo completo foi publicado na Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais.

Leia o artigo completo  A Q U I.

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